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Lucas Adriano Silva

Agricultura: pagando pela preservação ambiental?

Atualizado: 2 de nov. de 2021

A agricultura gera externalidades que podem ser geridas por meio de incentivos públicos. Mas como isso ocorre?



Os ecossistemas são responsáveis por sustentar as formas de vida na Terra. Isso ocorre por meio de uma infinidade de formas: pelo fornecimento de alimentos e de água potável, pela fixação do nitrogênio e do carbono, pela reciclagem de nutrientes e pela polinização de plantas, entre tantas outras.


Mas, dentro da enorme abrangência dos ecossistemas, os agrícolas são os maiores ecossistemas gerenciados do mundo. De uma área total de cerca de 13 bilhões de hectares, as lavouras e pastagens ocupam aproximadamente 5 bilhões de hectares, correspondendo a quase 40% deste total. As florestas e os bosques somam 4 bilhões de hectares, o que corresponde a quase 31% da área total .


Porém, apesar de todo o seu tamanho e sua importância, os serviços ecossistêmicos, em especial os que são baseados na agricultura, estão sendo desafiados de maneira inédita na história do planeta. A agricultura está sendo solicitada a fornecer um suprimento cada vez maior de produtos, commodities e matérias-primas, situação que, considerando previsões demográficas futuras de aumento da expectativa de vida, tende a se agravar.


A necessidade de aumentar a produção tem potencial para agravar os danos aos ecossistemas, principalmente em áreas ambientalmente frágeis, incluindo desertos, terras semi-áridas, montanhas, terras úmidas, ilhotas e determinadas áreas costeiras. Esse cenário pode ocorrer a partir de uma intensificação mal administrada da atividade agrícola, resultando em diferentes tipos de problemas, a exemplo do aumento dos níveis de nitrato nas águas subterrâneas e superficiais, da salinização e do aumento da poluição do ar e da água por resíduos do gado.


De modo a amenizar esses problemas, existem maneiras de melhorar a disposição dos serviços ecossistêmicos, principalmente por meio de políticas públicas.


No geral, essas políticas se materializam sob a forma de incentivos para os agricultores. Os agricultores são os grandes “gestores de recursos naturais” do planeta, com as suas atividades gerando enormes impactos sobre os serviços ecossistêmicos, que podem ser tanto positivos como negativos. A maior parte da renda dos agricultores é proveniente da produção de alimentos e de fibras, atividades que possuem o potencial de gerar, por exemplo, a recarga de águas subterrâneas, mas também podem acarretar um processo de erosão do solo.


Não obstante o tipo de impacto gerado pelas atividades agrícolas, no geral, os impactos não são refletidos nos rendimentos dos agricultores. Logo, a tendência é de que a geração de impactos não seja colocada como uma questão relevante nas escolhas dos agricultores, constituindo-se apenas em externalidades.


É nesse ponto que a atuação do poder público pode se fazer presente: a partir da motivação dos agricultores em reduzir os efeitos colaterais negativos das suas atividades, garantindo, ao mesmo tempo, que eles também possam ter condições para continuar a atender o aumento da demanda por produtos agrícolas.


Uma das maneiras para fazer que os agricultores passem a considerar a relevância dos impactos negativos e positivos de sua produção é a partir do pagamento por serviços ambientais (PSA). De maneira geral, o PSA consiste em remunerar (a partir de transferência de renda, por exemplo) os agricultores por serviços ambientais com impactos positivos para o meio ambiente, constituindo em um mecanismo de incentivo para a geração desse tipo de externalidade.


No Brasil, existem diferentes tipos de projetos de PSA em execução, sendo o Projeto Conexão Mata Atlântica um dos mais abrangentes e relevantes. A partir desse projeto, que abrange os estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo, produtores rurais prestadores de serviços ambientais são beneficiados por adotar práticas de conservação da floresta nativa, recuperar áreas degradadas e implementar técnicas produtivas sustentáveis. No Rio de Janeiro, por exemplo, foram selecionados 285 produtores rurais. Dentre as principais realizações do projeto, tem-se a conservação de aproximadamente 1.727,99 hectares de florestas.


O PSA também pode ser utilizado diretamente na redução dos impactos negativos, a partir da tributação sobre essas externalidades. Esse tipo de iniciativa já é comum no setor da indústria, em que, por exemplo, uma determinada fábrica que polui precisa pagar pela geração dessa externalidade.


A forma de aplicar o PSA depende dos direitos de propriedade, mas especificamente acerca de quem detém esses direitos, se são os agricultores ou a sociedade como um todo. No caso dos direitos de propriedade serem detidos pelos agricultores, a sociedade pode pagar aos agricultores por serviços ambientais desejados. Enquanto que, no caso desses direitos serem detidos pela sociedade, os agricultores podem pagar à sociedade uma contrapartida por alguma atividade que possa degradar o meio ambiente.


Outra questão está relacionada à identificação da fonte e da magnitude dos efeitos negativos das externalidades.


Apesar de haver participação do setor privado, os programas de PSA são, em sua maioria, financiados pelo poder público, demonstrando o tamanho da importância de se pensar em políticas públicas que atuem nesse sentido. Afinal, considerando a enorme necessidade de se elevar a produção ao mesmo tempo em que se faz indispensável levar em conta as externalidades, o incentivo de impactos positivos na agricultura geram benefícios para toda a sociedade. Isso é pagar pela preservação e, como contrapartida, lucrar com sustentabilidade.



Sobre o autor

Lucas Adriano Silva é Doutorando em Economia Aplicada pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Mestre em Economia e Bacharel em Ciências Econômicas pela UFV.


 

Os artigos do quadro Colunas de Opinião não refletem necessariamente a opinião do Conexão Gestão Pública.

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